Alimentos fecham ano com segunda menor alta desde 2018. Como ficam os preços em 2026? Veja o que esperar

Clima favorável, safra recorde de grãos e câmbio em baixa. Uma combinação atípica e favorável fez os preços dos alimentos consumidos em casa subirem 1,94%, segundo o IPCA-15, prévia do índice oficial de inflação. É a segunda menor alta desde 2018 – atrás só de 2023, quando chegou a ter queda. Parte desse alívio deve atravessar o ano que vem, com economistas projetando que a alimentação suba até 4,5%, abaixo da média anual de 7,7% da última década. O cenário, porém, tende a ser menos confortável para o governo. Em ano eleitoral, o dólar deve deixar de conceder alívio aos preços e o cenário externo adiciona incertezas.

Os alimentos são importantes porque respondem por 18% da cesta de consumo que compõe o cálculo do IPCA e, por isso, ajudam a segurar a inflação agregada, lembra André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

Segundo o especialista, esses preços ficaram comportados porque 2025 teve um regime de chuvas mais próximo da média histórica, favorecendo a produção de alimentos. E a queda do dólar ajudou, já que parte das matérias-primas agrícolas, como soja e milho, é cotada na moeda americana.

— Alimentação é câmbio na veia. Um volume de chuva adequado e safras boas também explicam o alívio — diz Braz.

As restrições temporárias às exportações de aves, após embargos sanitários por conta dos primeiros casos de gripe aviária em granjas no país, ajudaram a conter preços, lembra Fábio Romão, economista sênior da consultoria 4Intelligence.

O tarifaço imposto por Donald Trump, presidente dos EUA, também dificultou o escoamento de alguns produtos e resultou em mais alimento disponível no mercado doméstico, completa Romão, alertando que 2026 deverá ser mais difícil:

— No ano que vem, não vamos ter esse “céu de brigadeiro” no campo, embora algumas culturas ainda devam ter boas safras. O câmbio pode rumar para um patamar neutro. O dólar não vai atrapalhar, mas também não vai ajudar.

Comportamento dos preços — Foto: Editoria de arte
Comportamento dos preços — Foto: Editoria de arte

O que deve subir em 2026?

Segundo Alexandre Maluf, economista da XP Investimentos, o arroz, que caiu cerca de 27% neste ano, deverá subir e devolver parte da queda por conta da redução da safra. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima queda de 12% da produção do cereal.

Entre os grupos com maior risco de aceleração estão tubérculos, raízes e legumes, como batata, tomate, cenoura e cebola, que operam com preços baixos após anos de deflação e podem passar por reversão, agravada por fatores climáticos.

As carnes também deverão subir 8%, com o ciclo pecuário negativo, a oferta global mais restrita e a demanda externa aquecida. Frango, suíno e ovos poderão acompanhar o movimento.

Nos óleos e gorduras, a alta pode chegar perto de 5%, pois o óleo de soja concorre com o bodiesel na demanda pela oleaginosa. O café, que saltou 41% este ano, poderá cair 20% em 2026, com a melhora da safra global, mas não compensará o aumento dos últimos anos.

— Temos um risco cambial por conta das eleições e por questões internacionais. Outro fator relevante, e sobre o qual temos pouco controle, é o clima —diz Maluf, da XP.

A incidência de uma La Niña mais forte — fenômeno marcado pelo esfriamento do Oceano Pacífico — poderá atrapalhar a produção agrícola. Um câmbio em alta, por causa do cenário externo e das eleições, também pode pressionar.

Para além desses itens, o avanço dos gastos públicos e a ampliação da isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, em vigor a partir de janeiro, poderão aquecer a demanda e pressionar a inflação. Soma-se a isso a instabilidade geopolítica.

— Trump é uma incógnita, mas a postura que ele está querendo adotar, com dólar e preço do petróleo baixos, pode acabar ajudando um pouco — destaca Luiz Roberto Cunha, professor da PUC-Rio.

O impacto da inflação de alimentos nas eleições

O alívio na inflação de alimentos é importante para o cenário eleitoral, porque costuma pesar na avaliação popular sobre a economia e os governos. Os preços dos alimentos são muito perceptíveis e afetam diretamente o dia a dia das famílias.

Em evento no Palácio do Planalto ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva procurou capitalizar os dados positivos:

— O ano termina bem. O preço do alimento está caindo, as pessoas estão voltando a acessar coisas que ficaram mais caras. Mesmo a taxação que os Estados Unidos fizeram contra o Brasil terminou sendo irrelevante.

Levantamento do instituto de pesquisas AtlasIntel, em parceria com a agência Bloomberg, mostra em dezembro que a inflação voltou a influenciar negativamente a avaliação do governo. No entanto, em termos econômicos, analistas não veem a inflação de alimentos com papel central. Para 2026, o grau de incerteza sobre as projeções está mais ligado a fatores fiscais internos e geopolíticos.

Com base numa análise sobre a inflação nas duas últimas eleições, Cunha, da PUC-Rio, aponta que alimentos em baixa tendem a evitar desgaste político. Para o especialista em inflação, 2026 será parecido com 2018, com alimentos em torno de 4,4% e IPCA próximo de 4,5%, teto da meta.

— É um cenário diferente de 2021 e 2022. A vitória do Lula sobre o Bolsonaro foi bastante influenciada pela inflação de alimentos, que subiu 8,24% em 2021 e 13,23% em 2022.

Ainda assim, o desconforto com os preços existem desde que a pandemia gerou um desarranjo nas cadeias produtivas e elevou o patamar dos preços internacionais. Enquanto o IPCA subiu 38% entre março de 2020 e novembro de 2025, a alimentação no domicílio avançou 55,3% no mesmo período.

— É um mal-estar justificado — diz Romão. — É como se o orçamento que as famílias destinam para alimentação ainda ficasse pressionado.

Foto: Leo Martins/Agência O Globo

D1 com O Globo

Gostou Compartilhe..