O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), sinalizou que o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) deve perder o mandato se não voltar ao Brasil. O filho de Jair Bolsonaro (PL), que se mudou para os Estados Unidos em março, já disse que não retornará ao país enquanto não conseguir o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) e anistia ao pai e todos acusados em envolvimento em suposta tentativa de golpe de Estado.
“Não há previsibilidade para exercício do mandato à distância. Não há previsão no regimento para isso”, afirmou Motta em entrevista ao site Metrópoles, na quinta-feira (7/8). Aliados de Eduardo Bolsonaro falam em alterar o regimento interno da Câmara para permitir que Eduardo Bolsonaro siga exercendo seu mandato a partir dos Estados Unidos, onde está em autoexílio.
Para Motta, Eduardo fez uma “escolha política” ao se mudar para os Estados Unidos, onde articula com o governo de Donald Trump sanções a autoridades brasileiras. O presidente norte-americano suspendeu o visto de Moraes e outros ministros do Supremo. Depois anunciou punição a Moraes com a Lei Magnitsky. É a primeira autoridade de um país democrático a ser punida com as sanções previstas na norma, criada para restringir direitos de violadores graves dos direitos humanos.
A Lei Magnitsky prevê a proibição de entrada nos EUA, o bloqueio de bens e propriedades em território norte-americano e a proibição “extraterritorial de prestação de serviços por empresas com sede nos Estados Unidos” aos alvos da punição. Moraes diz não ter bens ou qualquer investimento nos EUA nem se preocupar com as sanções ou outras pressões para suspender o julgamento de Jair Bolsonaro e aliados.
“Temos um problema político-jurídico que envolve o deputado Eduardo Bolsonaro, que tomou a decisão de ir aos Estados Unidos e ficar lá defendendo teses que lhe são caras. E essas teses, nós temos que respeitar, ele está no exercício, apesar de não concordar com alguns movimentos que ele tem feito”, disse Motta na entrevista ao Metrópoles.
“O parlamentar, quando decidiu ir aos Estados Unidos, ele tinha um objetivo, sabia também daquilo que não seria possível manter, quando optou ficar à distância do seu mandato, do Estado que representa”, acrescentou Motta. Repetindo ameaças que tinha feito na semana passada, Eduardo disse que Motta poderia ser punido por Trump caso “não cumpra o seu papel enquanto representante da sociedade”.
“Eu não falo pelo governo americano, mas pode sim haver, como por exemplo ocorreu para Rodrigo Pacheco, que perdeu o seu visto. Ele perdeu o visto devido ao grande volume de pedidos de impeachment do Alexandre de Moraes que nunca sequer foram analisados. Então o Pacheco, ex-presidente do Senado, foi visto como uma parte, uma peça que sustenta esse regime. Se continuar nessa toada de Alexandre de Moraes abusando do poder e nada sendo feito, pode sim, possivelmente, nas cenas dos próximos capítulos, isso daí ocorrer”, afirmou Eduardo.
Motta disse que um dos ônus do trabalho dele como presidente da Câmara é o equilíbrio. “Nós temos que fazer o que é certo e nada nos tirará desse foco”, afirmou, em resposta à declaração de Eduardo. Motta deu a entrevista no primeiro dia após a tomada dos plenários da Câmara e do Senado por parlamentares da oposição.
O movimento da oposição ocorreu em uma frente conjunta entre o grupo na Câmara e Senado por um pacote com três pautas. A primeira é o PL da Anistia, que beneficia Jair Bolsonaro. A pressão também pretendia o avanço da PEC do fim do foro privilegiado, com o intuito de transferir para a primeira instância o julgamento do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado, hoje no STF.
Os dois itens estão em tramitação na Câmara, sem previsão de votação. O terceiro objeto de cobiça da oposição é o impeachment de Alexandre de Moraes, relator das ações contra Bolsonaro no STF. A ocupação começou no primeiro dia de trabalho legislativo após o recesso do Congresso e travou os planos de Hugo Motta e Davi Alcolumbre de retomar as votações na terça-feira (5/8).
Hugo Motta ameaçou punir deputados
Durante a tarde de quarta-feira (6/8), Hugo Motta, apoiado pela maioria dos líderes, informou à oposição que desobstruiria o plenário da Câmara. Após reunião, da qual não participaram os nomes da oposição, Motta marcou sessão para votação de pautas às 20h30. Ele também ameaçou os deputados que não quisessem liberar o plenário com a promessa de suspensão cautelar do mandato deles por seis meses.
A ameaça não surtiu efeito, e Motta só conseguiu se sentar à cadeira da presidência mais de duas horas depois. Nesse ínterim, os líderes recorreram a Lira para pôr fim à ocupação. As horas entre a determinação de Motta e o início real da sessão foram marcados por discussões e bate-bocas entre os deputados em um plenário onde só parlamentares podiam entrar.
Houve, ainda, entra e sai de líderes na sala de Hugo Motta e no gabinete de Arthur Lira. A oposição, nesse ínterim, largou mão de uma série de estratégias, e a deputada Júlia Zanatta (PL-SC) decidiu entrar no plenário com a filha de quatro meses. O gesto pretendia evitar a desobstrução do espaço, e a Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo PT, recorreu ao Conselho Tutelar contra a parlamentar.
Líder do PL pediu desculpas a Motta
Líder do PL na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) pediu, nesta quinta-feira, desculpas a Hugo Motta pela obstrução que a oposição causou no plenário e nas comissões do Congresso nos dois dias anteriores. A declaração foi feita ao microfone da tribuna. O parlamentar paraibano estava presente no plenário durante o discurso.
“Eu não gosto de fazer coisas, apesar de eu não ter feito isso em público, não te expus publicamente. Mas, ontem, com o acirrar dos ânimos, eu, com Vossa Excelência, não fui correto, e te peço perdão da tribuna da Câmara. Não fui correto no privado, mas faço questão de pedir perdão em público. Nós não estávamos emocionalmente estruturados para aquilo”, afirmou Sóstenes no plenário da Câmara.
Já em nota oficial, diferentemente do que parlamentares do PL haviam propagado após o fim da ocupação, Sóstenes disse que Motta não assumiu compromisso de pauta com a oposição. “O compromisso é com os líderes partidários e, nós, que representamos a maioria desta Casa, vamos, sim, pautar o fim do foro privilegiado e a lei de anistia”, diz o comunicado divulgado pelo líder do PL.
Pouco antes, Motta negou que tenha feito algum acordo com bolsonaristas em troca da liberação do plenário para as sessões. Na chegada à Câmara, nesta quinta-feira, ele disse que “o diálogo prevaleceu” e que foi possível demonstrar que “não abriria mão de reabrir os trabalhos”. Motta declarou ainda que nenhuma contrapartida foi colocada na mesa de negociação para que ele pudesse assumir os trabalhos.
Foto: Mandel Ngan/AFP
D1 com O Tempo